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REVISTA FOCO
Edição: Out/2009
Poetas de ontem, hoje e sempre.
Por Henriques do Cerro Azul
Hoje falarei de um poeta de ontem, Francisco Henrique Leite, depois Francisco Leite Serra Azul, que nasceu em Aurora, Ceará, no dia 3 de maio do ano de 1893, e faleceu em 1985. Era filho de José Henrique dos Santos e de Joaquina Leite dos Santos, sendo seus avós paternos Vitoriano Henrique dos Santos e Isabel Benício dos Santos, e avós maternos Manuel Luciano Teixeira Leite e Maria Leite Félix Soares. Vai este registro para aqueles que gostam de pesquisas familiares e se distraem com registros desse teor, nos locais da origem do biografado. Cedo ganhou mundo, como autodidata, mestre escola e cantador, casando-se no Distrito de Serra Azul, em Quixadá, tornando-se, em Fortaleza, conhecido como poeta Serra Azul, nome pelo qual ficou conhecido e que adotou. A notícia vem a propósito de que no dia 3 de novembro deste ano a família do poeta estará lançando a 2ª edição de seu livro Natureza Ritmada, num shopping da Aldeota, em Fortaleza, pela Oboé. Nada mais justo que esta página hoje trate desse livro, que incluiu seu livro anterior, Alfabeto das Musas, editado em 1924. Esse livro começa com o soneto O que diria Virgílio..., que assim expõe o resumo do conteúdo da publicação:
Teu livro, Serra Azul, em que constelas
as letras do ABC com várias cores,
É um pedaço de céu que tu revelas,
Dos teus altos ideais encantadores.
Não sei se é um céu com vinte e sete estrelas,
Ou se é um jardim com vinte e sete flores
O teu solar com as vinte e sete belas
Musas, com seus miríficos fulgores.
As vinte e sete virgens que descreves,
Não são moças humanas, são senhoras
vaporosas, sutis, fluidas e leves...
Vai continuando assim o teu idílio
Só com essas fantásticas pastoras
E aceita os parabéns do teu Virgílio
Esse é o preâmbulo do livro. A seguir vem a descrição das musas, iniciando com a Incógnita e a seguir, na ordem alfabética com Alice, Beatriz, Carmem, Dolores, etc. Incógnita é a homenagem à pessoa real da filha do Poeta, que se chamava Letícia. Vejamos esse soneto:
Procuro-a em vão por toda a parte. Visse-a
Hoje e pudesse conquistá-la em breve!
É uma virgem sem mácula, mais leve
Que o ar e mais sutil que uma carícia.
De uma igual formosura ninguem teve
Jamais lembrança e não terá notícia!...
Pois essa graça que se não descreve,
Só a encontro nos olhos de Letícia.
Mas que fazer? Sei que a outra não existe.
Nesse vale de lágrimas tão triste,
É impossível haver tal maravilha!
Julgando-a a Deusa da felicidade,
Me atribuo, por isto, a dignidade
De compará-la assim com minha filha.
As particularidades que notamos neste soneto são muitas. Como todos os sonetos do Alfabeto das Musas, é feito com versos decassilábicos sáficos (1º, 2º, 6º, 7º) ou heróicos (3º, 4º). Vemos que o 1º verso é uma rima composta. A rima do 5º verso é metafônica. A colocação pronominal clássica do 7º verso (“que se não descreve”) não é fruto do pedantismo gramatical, mas obedece à exigência do ritmo do verso sáfico. Vejamos agora o soneto Alice:
... Enfim não houve céu que eu não subisse,
Campos de flores que eu não percorresse,
Mares e abismos a que eu não descesse,
A ver se achava o que imitava Alice.
Cheguei ao mar e a pérola me disse:
“Quem sou eu? Ah! Se tal me parecesse!”
Nem houve flor que inveja não tivesse,
Nem estrela que ciúme não sentisse.
E na jornada espiritual que à face
De tudo andei, ninguém achei que fosse
Digno de que com ela eu comparasse.
Não encontrei, nem encontrei quem visse
Formosura no mundo como a doce,
Cheia de graça e angélica Alice.
A particularidade desse soneto é que as rimas são asse, esse, isse e osse, com rimas metafônicas apesar de homográficas. É um exemplo de prosopopeia e de mesodiplose. Vejamos agora o soneto Beatriz:
É mais formosa que a Beatriz do Dante,
Porque, se aquela fosse assim tão bela,
O poeta não teria tido aquela
visão de inferno e glória ao mesmo instante
Porque quem vir Beatriz, estou que cante
Somente a glória que ela vive, em si, revela
E só poderá ver inferno adiante
Ou purgatório, estando ausente dela.
Assim, para a beleza ser completa,
É preciso ter na alma a formosura
Que se ajuste à do corpo em linha reta.
E esta Beleza da alma se apresenta
Em Beatriz, na virtude e na ternura
De que a beleza dela se ornamenta.
Alusão ao poeta Dante, autor da Divina Comédia, o qual foi guiado por Beatriz. Há neste soneto também a figura de linguagem chamada de ironia. Depois falaremos sobre mais sonetos do mesmo autor.
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